sexta-feira, 11 de maio de 2012

Um momento de poesia (2)

                   Este escriba não se considera um poeta que para ser teria a sua alma vindo pronta dos recônditos do seu DNA e não veio. Mas canhestros seus versos surgem de uma emoção singular, extrapolando formas convencionais.
                    Este modesto poema fala da Cinelândia - praça a que se liga com muito amor - onde tombou morto, sob suas vistas, talvez a primeira vítima da violência do golpe militar de 1964, homem que dormitava inocente seu sonho alcoólico, estendido em um banco, a frente do Clube armado.

Olhem só:



A cinelândia.
VHCarmo.

Ouvi falar na praça da felicidade,
da angústia do povo sofrido
ouvi,

da ânsia de chegar ao topo do mundo.
senti.
Rodeado do lupem
respiro o odor acre da pobreza,
verbero uma praxis incerta,
incompreensível dialética.

Na praça os rostos são duros,
os sonhos voláteis
e há alguém que teoriza o amor às rosas.

 
Não sei
se plantadas no asfalto florescem idéias.
 
Creio na seiva do povo da praça,
nas calçadas de  pedra,
nos desvãos com cheiro de mijo.
nos trapos dos meninos famintos,
nos abrigos frios do “aterro”.

Amo essa turba feia,
com o fedor de suas feridas
com os sonhos de sua negritude
com o azedo de seu cotidiano
eu canto o meu hino de fé
ouvem-no os surdos das sarjetas,
as putas sem nome
e riem dele os mendigos desdentados.
 
Meio a idéias e revoltas,
a revoluções e reformas,
a gente falava e esbravejava
outro  canto de esperança.

Ali  pariu história.
Na praça tombou morto
um homem  
do alto de seu sono alcoólico.

Era o início de “longa e violenta noite”.

Na  mesma a praça raiou luminoso o dia
no grito da gente.

Era a liberdade,
“ainda que tardia”.
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VHCarmo.


VHCarmo. – Julho de 1985.









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