domingo, 20 de março de 2011

Que regime querem impor à Líbia ?

                      É profundamente preocupante a ação agressiva das potências ocidentais contra a Líbia. A gente já comentou neste espaço que o problema líbio não encerra nenhuma semelhança e afinidade de propósitos com os movimentos insurgentes nos paises árabes do Oriente Médio e do Norte da África.
                        Naqueles paises o povo nas ruas e praças estão desarmados e sofrem forte repressão, principalmente no Iêmen e no Bahren onde atuam as forças da Arábia Saudita, aliada preferencial dos EEUU.     Alí as potências ocidentais desconhecem a proteção das populações que estão sendo massacradas pelos ditadores e monarcas.
                        Na Líbia, diferentemente, os chamados  rebeldes têm por objetivo derrubar o governo do ditador Kadaffi, mas não têm qualquer ligação com movimentos populares e, estranhamente, desde logo obtiveram o apoio ocidental.
                        Os rebeldes, usando claro oportunismo, iniciaram um movimento armado e ocuparam algumas cidades estratégicas da Líbia, ligadas à indústria petrolífera. Em nenhum momento a mídia mundial explicitou a origem do movimento, suas raízes e seus objeivos. Kadaffi desde logo denunciou a interferência da França, dos USA e seus aliados ocidentais ( com a Nato e a CIA).   A França, país que mais se empenhou para a adoção das medidas de violação, por sinal, tem uma dívida imensa com a Líbia de Kadaffi.      O  filho do ditador ameaçou revelar algo não bem explicado e  pessoal contra Sarkozy. A coisa ficou no ar.
                     Embora invoquem que estariam agindo em favor do povo líbio para protegê-lo, as forças, ora chamadas de “aliadas”, lançam ataques indiscriminados - com armas poderosíssimas - contra a população das cidades. É evidente que estão assassinando indiscriminadamente, atingido muito mais a população que dizem proteger do que as chamadas força de Kadaffi que refluíram ao anúncio da agressão indiscriminada. Os habitantes não têm como se proteger dos mísseis poderosos , lançados sobre o território líbio.
                    Nesse episódio, a interferência das potenciais ocidentais visa claramente seus interesses geopolíticos na região, mesmo porque os rebeldes jamais revelaram a suas intenções e projetos e, certamente, não lutam pela democratização do país. O que fica evidente é a intenção de derrubar o ditador, naturalmente em favor da dominação externa que ora os apóiam.  Essas mesmas potências “mui amigas” dos ditadores que ora estão sendo contestados pelos seus povos arabes, apoiava também e até bem pouco tempo o ora sanguinário Kadaffi a quem recebiam em seus palácios.

                         Transcrevo, abaixo, o texto altamente esclarecedor do Professor e sociólogo Gilson Caroni Filho, que impõe uma séria reflexão sobre a questão. Embora um pouco longo, deve ser lido.

                                       Líbia e o DJ do Império.
                               Passadas duas décadas, e tendo vivenciado o que entrou para a história como Doutrina Bush, uma lição não pode ser esquecida pelas forças progressistas. Ainda mais agora, quando, a pretexto de “conter a barbárie de um ditador”, EUA, França e Inglaterra lançam mísseis na Líbia: o imperialismo encurta tempos e espaços.
Gilson Caroni Filho.

                  Ao começar a ofensiva militar contra a Líbia, as potências mundiais referendaram a nova estratégia estadunidense de manutenção de hegemonia global. Hoje é improvável que a Casa Branca queira se envolver diretamente em novo confronto militar. Talvez nem precise. Pouco a pouco, os Estados Unidos vêm conseguindo o aumento da cooperação internacional para alcançar seus objetivos geopolíticos. Sem os riscos de isolamento que marcaram a agressão imperialista ao Iraque e Afeganistão, a ação bélica no país árabe é amparada por uma resolução do Conselho de Segurança da ONU. Os sonhos de um mundo multipolar sofrem um desvio histórico de tal monta que não é exagero atentarmos para uma perspectiva internacional de extrema gravidade.
Nos anos 1920, os norte-americanos dançavam o “charleston” e diziam que eram "os anos loucos", enquanto nas ruas de Chicago, gangsteres italianos e irlandeses se enfrentavam à bala. Na Líbia, o guerrilheiro Omar al-Muktar, o "leão do deserto", lutava contra o fascismo italiano e, na Nicarágua, Augusto Sandino, o "general dos homens livres", combatia os marines do capitão Frederick Hatsfield. Muktar foi enforcado em 1931 e Sandino fuzilado em 1934. O “terrorismo” estava sendo contido.
Mais de meio século depois, Líbia e Nicarágua foram associadas por algo mais do que aquelas gestas antiimperialistas, quase simultâneas. O artífice dessa ligação foi o então presidente Ronald Reagan para quem Muamar Kadafi era o "cão raivoso" do Oriente Médio e o comandante Daniel Ortega "um capanga com os olhos de figurinista".
Em 14 de abril de 1986 foi realizado um ataque norte-americano a Trípoli, Bengazi e a outras três cidades por 18 bombardeios que levantaram vôo de bases na Grã-Bretanha, e 15 caças estacionados em porta-aviões pertencentes à 6ª Frota dos Estados Unidos no mar Mediterrâneo. A operação foi justificada como uma retaliação a um atentado em 5 de abril, em uma discoteca alemã, que teria matado 4 pessoas, deixando um saldo de 200 feridos. Na época, como sempre, Washington alegou possuir provas “irrefutáveis" da participação de terroristas líbios no atentado, ainda que não tivesse apresentado nenhuma.
Simultaneamente, a CIA, com o apoio da imprensa centro-americana, difundia a existência de comandos árabes realizando ações terroristas em território hondurenho, a partir de bases cedidas pelo governo sandinista. Como destacou o sociólogo Roberto Bardini, “ao tomarem conhecimento da alarmista campanha da mídia e da adoção de fortes e ostensivas medidas de segurança em Honduras, alguns observadores calcularam que tudo não passava de uma operação psicológica que teria quatro objetivos: justificar represálias militares contra a Líbia, demonstrar que a Nicarágua emprestava seu território para exportar o terrorismo, comprovar a existência de uma conexão Trípoli-Manágua. e, principalmente, conseguir que o Congresso aprovasse a destinação de US$ 100 milhões aos "contras".”
O que Reagan conseguiu com a agressão à Líbia? Um isolamento internacional sem precedentes. Ficou reduzido ao apoio da então primeira-ministra inglesa, Margaret Thatcher, e do governo israelense. Desde a guerra do Vietnã jamais se tinha presenciado uma onda tão forte de hostilidade aos Estados Unidos. Definitivamente, o pop dos anos 80 não tinha o mesmo poder de encantamento do charleston.
Passadas duas décadas, e tendo vivenciado o que entrou para a história como Doutrina Bush, uma lição não pode ser esquecida pelas forças progressistas. Ainda mais agora, quando, a pretexto de “conter a barbárie de um ditador”, EUA, França e Inglaterra lançam mísseis na Líbia: o imperialismo encurta tempos e espaços.
O Império é criterioso quando se trata de resgatar o que lhe parece ser seu fundo de quintal. A tentativa de modificar a nova ordem política da América Latina é o que move os passos de Obama na região. Transformar assimetrias em impossibilidades e mudar o perfil da política externa brasileira são os imperativos da vez.
Ao declarar que "nosso consenso foi forte e nossa decisão é clara. O povo da Líbia precisa ser protegido e, na ausência de um fim imediato à violência contra civis, nossa coalizão está preparada para agir e agir com urgência", o presidente dos Estados Unidos deixa evidente que, em nome do “hegemon”, está pronto para misturar sem dó nem piedade o hit radiofônico “Closer”, do “rapper Ne-yo”, com um “mash-up” tribal da Madonna para "Miles away". Espera-se que a pista, quase sempre lotada de ingênuos ou servis, repila com veemência os apelos do "DJ" do império.

Lula acertou na mosca. Não é muito difícil adivinhar quem veio para o almoço.

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil.
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VHCarmo.




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