A mídia em geral e os
jornais particularmente têm demonstrado pouca atenção à suas contradições que
cada vez mais se tornam evidentes e não têm
merecido sequer um reparo ou uma correção,
em homenagem ao público.
Parece até que
confiam plenamente em que as pessoas não
estão atentas e sejam mero recebedores de notícias e comentários sem ter um senso
comum, capazes de serem levados sem perceber que estão sendo enganados.
Tudo isto visando à
derrubada de um governo popular, colocando-se, na ausência de uma oposição sem
discurso, a sua insensibilidade quanto aos seus leitores aos quais não
respeita. É o jornalismo mais pernicioso e sem escrúpulos.
O jornalista Luciano
Martins, no Observatório da Imprensa, vai ao âmago desta questão ao comenta-la no texto abaixo transcrito.
Olhem só:
Um punhado de contradições
Por Luciano Martins Costa em 09/06/2014 na edição 801, no Observatório da Imprensa.
Quando o jornalismo se desvia de seus
princípios, sendo instrumentalizado como recurso para outros fins que não a
criação de conhecimento, entra-se numa zona cinzenta onde se torna difícil vislumbrar
a realidade.
Um dos sinais
dessa circunstância, na qual a busca da objetividade perdeu espaço para a
perseguição de objetivos políticos ou econômicos, é a eclosão de contradições
aqui e ali, que vão minando a confiança por parte daquela fração do público
ainda capacitada a interpretar o noticiário. Por exemplo, quando um jornal
passa meses insistindo que o país vive imerso na inflação e na carestia, e de
repente precisa afirmar que a inflação, afinal, não é assim tão grave, um texto
é suficiente para invalidar todos os discursos anteriores.
Ou quando outro
jornal, diante de manifestações violentas, exige uma ação mais rigorosa da
polícia e, no dia seguinte, se vê obrigado a dar um passo atrás, porque o rigor
preconizado acabou gerando mais violência, agora contra seus próprios
repórteres, o que fazer da verdade anterior?
Situações como
essas podem ser observadas na imprensa brasileira quase diariamente, e refletem
um aspecto determinante da prática que pode ser chamada de “jornalismo de
campanha”. Como numa guerra, a atividade da imprensa hegemônica do Brasil tem
sido marcada pela obsessão em tirar do poder o grupo político que chegou ao
Planalto em 2002, pela via democrática das eleições.
Como não há
justificativa possível para um golpe como o que foi patrocinado e insuflado
pela imprensa em 1964, trata-se de minar a confiança do eleitor com a
construção de um cenário catastrofista. O objetivo é implantar a insegurança
nas classes médias, sempre mais vulneráveis a crises, porque seus integrantes,
empenhados em consolidar o bem-estar conquistado a duras penas, tornam-se
suscetíveis a variações bruscas em suas rotinas.
Porém, quando a
campanha do pessimismo passa do ponto e começa a ameaçar os interesses do
negócio jornal, o discurso muda subitamente.
Escolhendo o
pior
Observe-se, por
exemplo, como o noticiário sobre a inflação traz uma mistura deliberada de
análises que ignoram variações sazonais de preços e a volatilidade
característica de países cuja economia depende muito do mercado interno de
consumo. Registre-se, também, como uma campanha explícita pelo aumento da taxa
oficial de juros ou do câmbio acaba produzindo uma situação incômoda para as
empresas, e de repente o discurso muda de direção.
Circunstâncias
como essas podem ser encontradas reiteradamente nos arquivos da imprensa. Mas,
ainda que o leitor possa apenas vasculhar jornais de dois ou três dias atrás,
vai identificar essas variações até mesmo nos editoriais. Veja-se, por exemplo,
o que publicou o Estado de S. Paulo no último fim de semana: no sábado (7/6),
para contestar os metroviários que deflagraram uma greve na capital paulista, o
diário afirma que a reivindicação de 16,5% de aumento salarial é escandalosa,
porque a inflação ficou em 5,2% nos 12 meses encerrados em abril – a data-base
dos metroviários.
Então, o leitor
atento corre a procurar a manchete na qual o Estado teria informado o público
de que a inflação havia caído em abril – e vai ficar muito frustrado, porque,
naquela ocasião, o jornal escondeu essa informação em meio a previsões
alarmistas.
Ora, se a
informação é boa como argumento contra os grevistas, também deveria ter sido
destaque no noticiário – ou não interessa arrefecer a campanha de terror sobre
uma suposta carestia? No dia seguinte ao desse editorial, domingo (8/6), o tema
inflação volta à página de opiniões do jornal, sob o título: “Inflação ainda
ameaça”.
Vai o leitor
prestigiar o editorialista e se depara com um texto no qual se afirma que
também a inflação de maio foi mais baixa do que o esperado pelos analistas – subiu
0,46%, “bem menos que em abril”. Note-se: desta vez, o editorial evitou a
análise ano a ano, e optou por comparar dois meses seguidos.
Evidentemente,
esses números, isoladamente, pouco falam sobre o que irá acontecer no futuro
próximo, porque, numa sociedade onde um grande contingente de indivíduos amplia
seu potencial de consumo, ocorrem movimentos bruscos de preços conforme a
demanda massiva. Mas pode-se apostar que, se houver duas alternativas, a
imprensa vai escolher a projeção mais pessimista.
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